VIDAS DE 32 | Mons. Luís de Abreu - Batalhão 23 de Maio.


Nasceu a 03 de setembro de 1897 na cidade de Valinhos - SP (que na época pertencia a Campinas), filho de Luiz Fernandes de Abreu e de dona Anna Alves de Lima Abreu. Fez seus estudos primários no Grupo Escolar “Francisco Glicério”, em Campinas (1907-1909) e de Admissão no “Externato São João” (1910-1911); Curso ginasial no Ginásio Gonzaga, em Pelotas, RS (1911), e no Seminário Menor de Pouso Alegre, MG, (1912-1913), e de Campinas (1915). Filosofia e Teologia no Seminário Maior de Campinas (1916-1922). Sua Ordenação Sacerdotal se deu a 15 de agosto de 1922 na Igreja Nossa Senhora do Carmo, em Campinas, SP, por Dom Francisco de Campos Barreto. Sua primeira tarefa foi cuidar da educação cívico-religiosa dos alunos do Colégio Diocesano Santa Maria, em Campinas. Foi Coadjutor em Mogi Mirim e da Catedral de Campinas (1924-1925), Vigário em Pedreira, Rio das Pedras, Itapira e Pirassununga. 

Engajei-me como capelão no Batalhão 23 de Maio”, de Amparo, logo designado para o sul de Minas Gerais. Nós partimos na tarde de 11 de julho: 89 rapazes de Amparo e dois oficiais da Força Pública” - Mons. Luís Fernandes de Abreu.


Em 1932 substitui o Pároco de Amparo, então enfermo, e dali partiu em 11 de julho de 1932 como Capelão do “Batalhão 23 de Maio” na Revolução de 1932. Ao fim da revolução ficou preso, foi condenado e recolhido em prisão no Rio de Janeiro até dezembro do mesmo ano. Libertado, voltou a Campinas, ficando adido à Catedral e Vigário Substituto da Paróquia de Vinhedo. Por indicação de Dom Barreto, em 1934, aceitou candidatar-se à Assembleia Legislativa do Estado, onde liderou as exigências da Liga Eleitoral Católica. Retornando à cidade, após seu mandato, assumiu a Paróquia de Nossa Senhora das Dores do Cambuí. Em 1939 foi designado pelo Governo do Estado para Cadeira de Filosofia na USP. Novamente envolvido em movimentos contrários ao Governo Federal – desta vez o Estado Novo de Getúlio Vargas – o padre Luiz de Abreu acabou preso na Capital do Estado.
Em 1942, organizou o Congresso Eucarístico Diocesano e a Obra da Adoração Perpétua do Santíssimo Sacramento. Exerceu o paroquiato em Águas de São Pedro entre 1943 e 1944 e, de 1944 a 1947, em Nossa Senhora das Dores, em Limeira. Foi Capelão do Hospital da Escola Paulista de Medicina por cinco anos. Em 1952, Pároco de Serra Negra, e, de 1957 a 1964, professor e Vice-reitor do Seminário Menor de Campinas; após, até 1970, Pároco em Iracemápolis; em seguida assumiu a Capelania da PUC-Campinas, da qual tornou-se o primeiro Pároco, lecionando Teologia, Doutrina Social; depois assumiu a Reitoria do Templo Votivo e a Capelania da Santa Casa de Misericórdia até seus 90 anos, quando por enfermidade recolheu-se na Casa do Padre da Arquidiocese, vindo a falecer com 97 anos em 13 de março 1995, sepultado no Cemitério da Saudade, em Campinas.
Além dos cargos exercidos, Monsenhor Abreu foi ainda Juiz do Tribunal da Arquidiocese, Cônego Catedrático do Cabido Metropolitano, chegando a ser seu Arcediago (Presidente); pertenceu, com muita participação, da Associação dos Veteranos Paulistas da Revolução Constitucionalista, membro fundador da Academia Campineira de Letras, agraciado pela Santa Sé com o Título de Monsenhor Camareiro Secreto.
Contou ele que em 1931 sentia-se revoltado com a situação de São Paulo, um Estado sempre progressista mas que naquela época “se empobrecia diante dos desmandos do Governo Brasileiro”. Foi assim que, recebendo a notícia de “injusta destruição” do interventor paulista, Laudo Ferreira, o vigário de Amparo em 1932, padre Luiz Fernandes de Abreu, então com 34 anos, escreveu um artigo para o jornal “O Coice”.

Dois dias após, o vigário de Amparo já participava das reuniões dos conspiradores paulistas e, no ano seguinte, combateu contra as tropas federais nos combates de Pouso Alegre, Sapucaí e Lindóia. Voltando para Amparo, padre Abreu resistiu à primeira investida armada do Governo naquela cidade, juntamente com mais de 100 companheiros. No segundo combate de Amparo, sem munição, ele e 115 soldados paulistas acabaram presos e conduzidos a pé, de lá até Itapira.
Em Itapira foi condenado pelo Conselho de Guerra, tendo que embarcar para o Rio de Janeiro, onde permaneceu 5 meses preso numa penitenciária imunda.

 



E N T R E V I S T A

Monsenhor Luís de Abreu é sobrevivente porque Deus assim o quis. - Um capelão recolhido à Casa da Correição, no Rio - Com os melhores homens de São Paulo entre quatro paredes - Saudades da "turma" - Silêncio atrai silêncio.


Na Revolução de 32 o clero esteve plenamente com o povo. Na qualidade de capelães, deram os sacerdotes assistência espiritual aos voluntários em todas as linhas de frente. Misturando aos soldados constitucionalistas o lenitivo religioso, inclusive esses eclesiásticos não recuavam diante de perigo algum. Cada contingente militar possuía, no "front", a presença de um padre. Dentre eles, muitos se distinguiram.
Do padre Arnaldo Pereira Morais Arruda, antigo coadjutor da paróquia de São José do Belém, que acompanhou o 1º batalhão da Liga de Defesa Paulista, conhecemos fatos heroicos. Foi uma das sotainas corajosas, chegando a expor-se ao fogo dos combates e sem jamais atender a nenhuma censura amistosa. Certa vez, ao ser advertido, respondeu: "Sou soldado de Deus e preciso ir ao encontro do soldado da Lei e da Liberdade!".
Noutra circunstancia, tal expressão não passaria de simples frase, mas, naquele momento em que foi dita, quando a metralha sibilava e os feridos tombavam, agonizavam e sucumbiam, o sentido era de absoluta ausência de medo.
Nome também inolvidável, cujos atos de bravura se rivalizavam com os dos próprios pelejadores, foi o de monsenhor Luís Fernandes de Abreu, nosso atual entrevistado.
Esse não se poupou. É sobrevivente porque Deus assim o quis.

Nas horas de luta sua palavra cristã envolvia todos os setores possíveis. Esquecido de si mesmo, e só cuidando de colaborar junto ao próximo, houve instantes em que invadiu o campo do adversário, a empunhar apenas a arma pacífica do crucifixo, com o qual procurava exorcizar os iludidos que manejavam os fuzis cogitando a manutenção de um usurpador no poder.E então caiu nas malhas dos ditatoriais.
Monsenhor Luís Fernandes de Abreu esteve recolhido à Sala da Capela, na Casa da Correção do Rio de Janeiro, situada na rua Frei Caneca. Conviveu com a totalidade dos cristãos ilustres que ali sofreram reclusão e de onde partiram para o exílio. Guardou, na memória privilegiada, vários textos da famosa "Antologia", elaborada no presidio politico. E costuma repetir o trecho do dr. Pedro Monteleone que, da trincheira das colunas de A GAZETA, fora transferido para aquela detenção ditatorial. Ouvimos, ao monsenhor Luís Fernandes de Abreu, revivê-las com a voz cheia de ternura:
- "É esta a minha primeira prisão. Honrosa para mim. Dizem que é por São Paulo maravilhoso e glorioso. Se assim é, outras que venham. Será sempre agradável. Mas faço questão da "turma".
Neste período final, ao assinalar "faço questão da turma", há ares desportivos de justa exigência, de parte do dr. Pedro Monteleone. E isso era razoável. Os melhores homens deste São Paulo se encontravam entre aquelas quatro paredes, fossem civis ou militares.
Graças á intervenção de d. Mamede, na época auxiliar de d. Nery, ambos extintos, foi permitido que em companhia deste ultimo continuasse o monsenhor Luís Fernandes de Abreu como prisioneiro, tendo para isso d. Nery empenhado compromisso perante a ditadura.

EM CAMPINAS: No sossego da cidade de Campinas, hoje, infelizmente, sem as andorinhas, outrora louvadas em prosa e verso, através de páginas de Rui Barbosa e das estrofes de Alberto de Oliveira; na tranquilidade de Campinas não há excesso de fumaça e nem excesso de rumores. As ruas não apresentam buracos e o tráfego de automóveis não se exorbita.
Procuramos o monsenhor Luís Fernandes de Abreu. Aproveitava ele o início das férias para fazer retiro religioso. Alegou logo que não se alongaria nas respostas. Compreendemo-lo perfeitamente. Ia para o silêncio do retiro, isolamento que é convite à meditação, e não queria, já assim preparado, entornar frases. Silêncio atrai silêncio.

RESPOSTAS RAPIDÍSSIMAS: A nossa curiosidade vai dizendo:
_ Nasci na fazenda Cabreúva, de meu avô, chamado Antonio Fernandes de Abreu. A fazenda Cabreúva é hoje do município de Valinhos e antes foi de Campinas.
_ Desde quando reside em São Paulo?
_Sempre.
_ Os cargos que exerci ou exerço? Fui pároco de Pedreira, Rio das Pedras, Capivari, Cambuí (Campinas), São Pedro, Limeira, Serra Negra. E deputado estadual de 1935 a 10 de novembro de 1937. E professor na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo. Atualmente, sou vice-reitor e professor no Seminário de Campinas.
_Porque tomei parte na Revolução de 32? Por ser contra a toda ditadura e para desagravar os brios paulistas.
_Os homens daquela época que maior impressão me causaram foram: Dr. Pedro de Toledo, Ibrahim Nobre, dr. Altino Arantes, general Marcondes Salgado.
_Se fui exilado? Não. Preso na cela 45 da Casa de Detenção, no Rio de Janeiro.
_Abandonou a política na fase da reconstitucionalização do País?
Brandamente responde-nos:
_ Já o disse. Não. Fui deputado até 10 de novembro de 1937.
_ Se sinto saudades de 32? Muita.
Iamos finalizar. Os momentos do monsenhor Luís Fernandes de Abreu prefixavam-se no itinerario ao mutismo e ás orações.
Perguntamos-lhe, ainda, qual a mais forte recordação que retinha de 32?
E veio a frase que serviria de epílogo à breve entrevista:
_Combate de Amparo, quando caí prisioneiro.



FONTE: A Gazeta 

Comentários